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Pedagogia da Esperança?
Publicado no Jornal do Commercio no dia 13 de julho de 2021
Flávio Brayner
Minha querida colega de UFPE e diretora da Rádio Universitária Paulo Freire, Paula Reis, me convidou para um conjunto de três entrevistas radiofônicas sobre o pensamento de Paulo Freire. A última pergunta que ela me fez, no terceiro programa, dizia respeito a um neologismo – "esperançar" – que os paulofreireanos gostam muito de usar, emulando o Mestre que também gostava de criar palavras (“rigorosidade”, “boniteza”...). Freire escreveu uma “Pedagogia da Esperança”, 23 anos depois da sua principal obra (Pedagogia do Oprimido), em que relembra sua infância, sua formação e, finalmente, tenta debater com seus críticos a respeito dos mal entendidos que cercaram a Pedagogia do Oprimido. Mas, se Freire desenhou o “Oprimido” como personagem de uma pedagogia específica, construindo uma teorização sobre o diálogo, a transitividade da consciência ou a noção de libertação, o mesmo não ocorre com a “Esperança”. Ou seja, a rigor não existe uma “pedagogia” da esperança: não há ali, naquele livro, nenhuma teorização propriamente pedagógica sobre um certo “esperançar” - que não é a mesma coisa que ESPERAR (que a utopia se realize na história). Aliás, a Esperança é uma das três Virtudes Teologais (junto com a Fé e a Caridade) e trazê-la para o interior do pedagógico apenas mostra o quanto nossa educação ainda sofre de déficits de laicidade e o quanto nosso mais importante educador faz uso de um léxico banhado em religiosidade (anunciar, denunciar, travessia, caminhar) como se a fé na educação como motor de progresso social fosse um sucedâneo de nossa fé religiosa na salvação individual.
Além do mais, o pedagógico é uma relação específica, normalmente entre pessoas com experiências de mundo desiguais (educação de adultos é outra coisa) e exige sempre a nomeação da consciência do Outro como consciência “carente” ou “insuficiente” (senão não é possível legitimar o ato educativo), “Outro”, aliás, que precisa amadurecer, saber ler, socializar- -se, compreender o mundo, etc. Uma relação altamente institucionalizada na “forma escolar” (o próprio “paulofreireanismo” é a expressão desta institucionalização!). Assim, construir uma pedagogia da esperança é, de certa maneira, INSTITUCIONALIZAR A ESPERANÇA, tanto quanto o Cristianismo fora institucionalizado numa doutrina, a partir de Paulo de Tarso (Epístolas). Bastaria, a meu ver, que tivéssemos uma educação pública de boa qualidade para todos que a ESPERANÇA estaria entre nós. Sem necessidade de uma pedagogia que a disciplinasse!
*Professor titular da UFPE